sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Geração sem memória é geração oca


Assinala-se este mês mais um ano da navegabilidade do Douro. Foi em finais de outubro de 1990, que uma embarcação turística, com 170 pessoas a bordo, subiu pela primeira vez o rio, desde o Porto até a Barca D'Alva. De então para cá, revolucionou-se o turismo de uma região e de um país. Centenas de milhares de turistas de todo o mundo, cruzeiros de luxo, milhões e milhões de euros… fluem anualmente pelas águas do Douro.

Mas será que todos os que hoje usufruem deste filão milionário saberão que a luta para tornar o Douro navegável em toda a extensão (210 quilómetros) foi dura e longa? Uma luta de David contra Golias (o Douro contra Lisboa) que começou em 1965? De início, procurava-se escoar pela via fluvial os produtos do Cachão, o ferro de Moncorvo e outras riquezas naturais, num tempo em que a instalação da indústria siderúrgica e a extração mineira (volframite, hematite, cassiterite, cromite, arsénio, manganez, antimónio, ouro, prata…), abriam horizontes novos à economia da região.

A navegabilidade impunha-se, pois, como solução. Contudo, o Douro continuava o rio de mau navegar. A memória dos naufrágios e lutos nas povoações ribeirinhas e as ermidas nas margens a recordar as tragédias dos velhinhos rabelos, continuavam a lembrar os perigos seculares do rio. A remoção de obstáculos à passagem de embarcações de grande porte, assim como a construção de eclusas nas barragens, eram investimentos necessários, aos quais Lisboa virava costas. Lisboa era a capital, o resto paisagem. A luta iria, pois, ser longa e difícil. Faltavam “guerreiros” que afrontassem o regime. Afrontou-o um velho jornalista, Rogério Reis, hoje votado ao mais injusto silêncio. Alimentou durante anos uma campanha ininterrupta em prol da navegabilidade, escreveu um livro sobre o tema, fez centenas de reportagens e editoriais, conferências e ousadas interpelações a governantes (ainda o conheci nessa luta) antes e depois do 25 de abril. A batalha foi ganha, está bem de ver. Mas já não para os grandes objetivos originais (esses perderam-se), e sim para abrir passagem aos luxuosos cruzeiros.

Rogério Reis morreu invisual, num bairro social de Vila Real sem nunca ter entrado num desses cruzeiros que hoje drenam milhões Douro acima e Douro abaixo. Será que alguma vez, ao celebrar-se mais um aniversário da navegabilidade, se lembrarão dele, evocando a sua memória? Uma geração que se habitua a apagar a memória, ainda que hoje lhe corram os milhões pelas mãos, um dia acabará oca, ou, pior ainda, seca como palhas alhas.

in JORNAL DE NOTÍCIAS, 27-10-2017

domingo, 27 de agosto de 2017

Uma polémica vergonhosa que quis transformar Portugal numa nação de imbecis



Conservo ainda alguns livros de estudo dos meus maiores. Um deles, este livrinho da 4ª classe que era de estudo obrigatório há quase 70 anos, e com aprovação do governo de Salazar. Ou seja, ele é que dizia o que as crianças deviam ler ou não.
E, afinal, hoje assistimos ao mesmo.

Com que direito o atual governo mandou (ou aconselhou, que dá no mesmo) retirar do mercado dois livrinhos de atividades para crianças (que os pais são livres de comprar ou não), e fê-lo empurrado por uma polémica vergonhosa, alimentada por gente desocupada, ignorante, negligente, que nem se deu ao trabalho de avaliar a globalidade dos conteúdos  das duas publicações em causa?
Um país a passar por desgraças tamanhas, que deviam dar muito que pensar a todos… e esta gentinha, de pensamento rasteiro, facebookiano, a entreter-se e a tentar entreter o país com parvoíces destas!

Mas melhor do que eu, que o diga ele: aqui